[Leia a Parte 1]
Acordei
particularmente bem disposto naquela tarde. O tempo me ensinou que a melhor
maneira de combater uma criatura é aprender seus hábitos, e segui-los à risca.
Certa vez demorei um pouco mais para acordar e, quando finalmente o fiz, já
eram quase nove da noite e eu não estava na minha cama. Os cretinos tinham me
seguido na noite anterior e acharam que seria uma boa ideia me levar para um
joguinho. Eles só se esqueceram de verificar se eu estava armado: a adaga que
eu guardo no meu coldre de tornozelo nunca ficou tão ensopada de sangue
vampírico.
Desde aquela noite
decidi adotar um estilo um pouco mais nômade, me mudando pelo menos uma vez a
cada dois meses, saindo de casa sempre antes do anoitecer e voltando para ela
sempre depois do amanhecer. No início isso dificultou um pouco meus contatos
com a Inquisição, mas a era dos computadores logo surgiu, trazendo consigo
Alucard, meu notebook.
Foi exatamente o
que eu fiz naquela tarde. Rumei até uma cafeteria próxima à minha casa atual
com Alucard na mochila. Fica mais difícil correr com uma mochila pesada nas
costas, mas eu quase nunca sou pego desprevenido. Minha rotina diária consiste
em, basicamente, passar numa cafeteria, tomar um capuccino enquanto verifico as
novas oportunidades no site da Inquisição local, guardar minha mochila em uma
igreja afiliada e partir para a caçada. Isso poderia se repetir algumas vezes
no decorrer da noite, e eu também precisava me alimentar, mas sempre procurava
lugares diferentes a cada acesso. Ainda noutra noite descobri uma rede de
lanchonetes 24 horas que oferece meu prato preferido: sanduíche de almôndegas.
Nunca mais eu tive que procurar refeição numa igreja. Depois que a noite ia
embora, sobrava algum tempo para minha vida pessoal, durante o qual eu gostava
de atirar em outras criaturas no computador, como zumbis ou demônios. Alguém
poderia dizer que meu hobby não é muito diferente do meu trabalho, mas
acredite: zumbis e demônios geralmente não são dotados de presas retráteis.
Mas, naquela
noite, antes mesmo que eu pudesse acessar o site da Inquisição, meu notificador
de e-mails exibiu uma mensagem dizendo que eu tinha um novo e-mail não lido. Decidi
abrir minha caixa de entrada para lê-lo.
“Romero”, dizia a
mensagem, “Encontramos o quartel general vampírico de Megalópolis. Estamos
convocando todos os caçadores da região e vamos invadi-lo às cinco e meia da
tarde. É um trabalho por fora, então não espere que a Inquisição nos remunere,
mas será uma boa oportunidade para nos livrarmos dos sanguessugas. Se tiver
interesse, encontre-nos no campo de futebol da Várzea às cinco e quinze”.
Apenas isso. Não
tinha nenhuma assinatura e o remetente não estava na minha lista de contatos.
Olhei no relógio: eram cinco e vinte agora. O bairro da Várzea ficava a
aproximadamente dez minutos de carro, mas eu não possuía um desde que os
malditos vampiros me viram dentro do meu Golf. Quando levantei na tarde seguinte,
a polícia e o corpo de bombeiros estavam terminando de remover os destroços.
O jeito seria
pegar um ônibus. Mesmo que eu chegasse atrasado, poderia seguir o cheiro de
alho característico de uma aglomeração de caçadores. Por sorte, havia uma pequena
igreja católica afiliada à Inquisição quase exatamente em frente à cafeteria
que escolhi hoje. Deixei minha mochila por lá e, quando estava saindo, avistei
o ônibus para a Várzea. Depois de uma breve corrida, entrei no ônibus e, pouco
mais de dez minutos depois, cheguei no campo de futebol.
Já estava
começando a escurecer, mas consegui sentir o cheiro de alho que meus
companheiros caçadores deixaram para trás. Segui-o até o velho galpão
abandonado. Diversas empresas já tinham tentado se estabelecer por ali, mas os
negócios nunca davam certo e o lugar ganhou fama de amaldiçoado. Bem, se era o
quartel general vampírico da cidade, ele fazia jus.
Entrei no beco
aonde o cheiro de alho culminava e descobri uma porta entreaberta: a porta dos
fundos. Estava realmente escuro por ali, mas entrei assim mesmo. Uma caçada
como aquelas não poderia me intimidar.
É claro que eu não
contava com o desgraçado que estava me esperando atrás da porta com um bastão
de beisebol.
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