sexta-feira, 10 de junho de 2011
Crônica Nerd #5: A Fronteira Inicial - Parte 2/4
[Leia a Parte 1]
Aquele devia ser o código mais complicado que eu já precisei decifrar, e olha que eu já tinha decifrado os mais diversos códigos coletados pela nave mãe, incluindo, mas não se limitando a: pedidos de socorro enviados pela tripulação de nossas naves investigativas, quando alguma coisa falhava ou quando encontravam uma forma de vida particularmente agressiva, ondas de rádio emitidas por sociedades alienígenas longínquas, contendo palavras em uma língua que eu não conhecia, assinadas por uma tal de "NASA", seja lá o que isso quisesse dizer, mensagens de congratulações, enviadas pela nave mãe, ou de felicitações por uma data especial, enviadas pela base planetária, em sua maioria contendo imagens fofinhas, mensagens de erro do sistema, pedindo que fosse contatado o administrador, entre outras.
Ainda assim, aquele código estava me fazendo suar. Haviam "t's" em lugares que eu nunca tinha visto antes, como na linha 14, que era o espaço reservado para as informações estruturais do código, e caracteres não reconhecidos espalhados por todo o código, interpretados pelo computador como "quadradinhos". Eram estes que me davam mais trabalho, pois eu precisava decifra-los no método da tentativa e erro.
Apesar de tudo isso, não era esse o propósito de minha missão. Decifrar códigos era apenas uma função secundária, e eles só pediam para eu fazer isso porque eu era a melhor. Minha função primária era programar. Isso mesmo: programar, criar aplicações para os computadores da nave, desde joguinhos para distrair os tripulantes nos momentos de folga (dos quais o meu favorito e do qual eu tinha particular orgulho era um em que era preciso arremessar jacarés alados contra os elefantídeos, que tinham roubado os ovos dos jacarés, usando um estilingue gigante), até protetores de sistema, que serviam para detectar arquivos não solicitados ou prejudiciais nos sistemas da nave, e para afastar possíveis invasores de sistema, em sua maioria, cidadãos da superfície revoltados por não terem sido escolhidos para tripular a estação espacial de Vieta. É óbvio que eu sempre precisava ficar atenta com as novas formas de invasão que os invasores bolavam. Para tranquilizar os tripulantes, sempre que eu descobria algum ataque novo e conseguia bolar o contra-ataque, era executada, em alto e bom som, uma mensagem que dizia "as definições de ataques foram atualizadas".
Depois de algum tempo tentando decifrar aquele código, finalmente entendi o que estava acontecendo. Aquele código havia sido enviado por um de nossos inimigos do planeta Nemico, do sistema estelar vizinho. Desde que Zeme ganhou o espaço, o planeta Nemico declarou guerra contra nós. Acontece que eles já possuíam a tecnologia necessária para a construção de naves e estações espaciais antes de nós, e acreditavam serem os únicos desta galáxia a terem conhecimento para tal. Quando desenvolvemos o primeiro motor de probabilidade finita, que permitia cruzar a galáxia em poucas horas, o instinto de guerra deles aflorou, e eles passaram a nos atacar, a fim de obter, na marra, a nossa tecnologia.
Não demorou muito para que Angelo, o cientista, desenvolvesse o primeiro escudo refletor da galáxia de Kalawakan. Quando o povo de Nemico tentou atacar o planeta Zeme novamente, teve seus projéteis refletidos de volta, e a guerra parou. Eles logo nos enviaram uma mensagem declarando que entrariam em trégua temporária, mas que não desistiriam de nos tomar a tecnologia da probabilidade finita assim que tivessem a oportunidade.
Fiquei cada vez mais curiosa com o código com o qual estava lidando. Se foi o povo de Nemico quem o enviou, coisa boa não devia ser, mas o que será que eles estavam tramando?
"Capitão Dúijan", chamei, ao que o comandante, um homem alto e loiro, olhou para mim. "Este código que o senhor me pediu para examinar vem do povo de Nemico. Devo abortar a operação?"
"De maneira nenhuma", respondeu o comandante. "Se vem de Nemico, este é só mais um motivo para decifra-lo".
Fiquei olhando para seu sorriso por um tempo, até que ele se virou novamente para a grande janela para a qual estava olhando. Por ela, era possível observar o planeta Zeme em sua totalidade. De tão alto, ele parecia uma gigantesca esfera verde e azul. Lá embaixo, eu sabia que a coisa era bem diferente. As cidades eram tomadas de cinza, e muito pouco verde podia ser visto no dia a dia. Apenas nos oceanos era possível contemplar o azul que, por sinal, já estava sendo assaltado pela poluição dos esgotos.
Voltei-me para meu trabalho, decidindo me preocupar com o planeta depois. Há tempos eu não fazia parte daquele lugar, e a única pessoa lá de baixo com quem eu ainda mantinha grande contato era com a minha mãe. Ela me contava, quase diariamente, suas aventuras diárias. Desastrada que só, tentava cuidar de minha antiga casa enquanto meu pai ia trabalhar em uma fábrica de naves pessoais. Lembrei-me de meu lambo, um animal quadrúpede e peludo que era comumente adotado como bicho de estimação pelas pessoas.
Então, finalmente, terminei de decifrar o código, e me assustei com seu conteúdo. Tratava-se não de uma mensagem, mas de um comando de desativação, e eu tinha acabado de aciona-lo. Observei atônita enquanto todos os alarmes da estação espacial disparavam. Nas telas de todos os computadores do lugar podia-se ler a frase "A trégua acabou". Finalmente entendi o que aquele código estava desativando: o escudo refletor que protegia o planeta Zeme. Pela mesma janela onde momentos antes eu tinha visto meu planeta natal, eu agora via uma quantidade absurda de naves negras cobrindo o céu de Zeme. No momento seguinte, fui agarrada por dois homens, que seguravam, cada um, um de meus braços. Quando eles me jogaram em um quarto escuro da estação espacial, bati com a cabeça no chão. Só tive tempo de ver os dois homens, vestidos com um uniforme preto, saírem da sala e fecharem a porta, antes de apagar.
[Leia a Parte 3]
Um comentário:
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Boa crônica
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